segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Encontre-me nos teus Olhos

Isto tinha acabado de ser sentido como uma liberdade manifestada que rasgava meu peito e meu sorriso automático de todas as manhãs. Eu precisava estar lá, eu sabia o quanto meu destino esperava por isso. E, ao mesmo tempo em que eu colocava meus pés naquele obscuro carpete indiano, pude vê-la de lado, ao fundo. E ela permanecia quieta, calada - e frágil, a meu ver - como todas as outras vezes que eu já tinha a avistado; ela estava naquele canto como de costume. E eu sabia que aquele café já não era mais tão grande e movimentado para que eu pudesse não a reconhecer no meio de quem quer que fosse. Desse dia eu me lembraria bem, eu atrasara demais esse momento até que eu conseguisse só pensar em olhar em seus olhos. Não com o medo de ser rejeitado instantaneamente, mas porque eu me perdia mais e mais em tanta ostentação e divagação que eu fizera dela, de seus olhos, sentimentos, e sensibilidade; que até desconhecia qualquer reação que eu pudesse ter se ela realmente corresponde-se meus anseios. Eu a vangloriava até por causa do mesmo ar que tragávamos todas as manhãs desde que o inverno começara. 

E a mais pura verdade é que, desde o dia em que eu pude deixar algumas lágrimas rastejarem dolentemente em minha face, por conta de outra pessoa, que outrora eu encontrara e também me perdera, eu jamais ansiei encontrar novamente alguém que preenchesse o motivo que me induzia a levantar todos os dias me sentindo são e salvo. Talvez eu até chegasse a tentar entender o que isso significava, mas eu sabia o quanto doía. E eu sempre soube que apenas eu sabia. Mas parece que quando nós, miseráveis seres que colecionam dores, tentam extrair o mais verdadeiro de uma relação ou indagação amorosa é que flagelamos o que já não permanecia intacto. Quem pudera entender algo assim. E eu que sou tão jovem, já me sinto triunfante com a ausência do restante das pessoas. Sinto-me bem com a falta dos outros, com a falta das coisas, com a ânsia de querer algo e ter a possibilidade - mesmo que mínima - de arriscar. E não para conseguir, mas para ver até onde essa minha falta de medo pode me levar.

Sentado, eu continuava remotamente distante dali. Ela me levara mais alto, sem muita indagação, ou arma precisamente ajustável para tal artifício. Somente seus olhos e doçura labial me conquistaram. O modo como encarava a comida também parecia completar sua ingenuidade com que se relacionava com os elementos a volta, até a forma como mordia e que olhava para baixo. Talvez eu estivesse apenas apaixonado demais para não ver a falta de disciplina que nela residia, mas que importa? Eu apenas sei que querer é o que me empurra a querer mais, que me sufoca a querer mais, que me aproxima a querer mais. Porque eu também sei que durante muito tempo eu me recusei a tentar de novo, a reagir, a sentir e a me deixar sentir. Mas esqueçamos isso. O importante é que fui caminhando até ela, e eu sentia cada um de meus pesados passos. Em breve eu estaria em sua frente. E de tudo o que reagia em mim enquanto eu ia, eu me preocupava com meu coração que pulsava estonteante. Pronto, ali estava eu, diante de todos os meus medos, rejeições, devaneios e sentimentos. Eu que jamais acreditei em amor, eu que já me decepcionara jurando jamais tentar novamente, agora me encontrava sorrindo, de frente à minha salvadora. Àquela que me salvara à deriva do precipício interior. Ela me olhava atônita, sem que jamais soubesse que eu a avistava todos os dias. Ali estava ela, ordinária e cintilante. E eu a queria com todas as forças, mesmo sabendo que se ela jamais me quisesse, eu sairia dali, me sentindo completamente livre.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Dezesseis anos.

Em sete de fevereiro de mil novecentos e noventa e três, às doze e cinquenta e cinco eu dei meu primeiro suspiro nesse mundo. Dezesseis anos atrás... Nessa época, Tarantino já havia sido descoberto como um dos grandes cineastas dos EUA, Marilyn Monroe já havia sido encontrada morta, Kurt Cobain morreria no ano seguinte, Stanley Kubrick faria 63 anos, a Guerra Fria já havia terminado dois anos antes... Muita coisa o homem já havia passado e lutado na busca de descobrir sua origem e seu destino. Imagino que nesse mesmo dia, muitas pessoas também se foram. Apenas sei que vim ao mundo não apenas por conseqüência dos atos de papai ou mamãe, não por precisar ser mais um num mundo globalizado, mas para inquietar os valores convencionais humanos, para escrever sobre a busca, sobre a liberdade, sobre o medo e sobre o amor. Para de alguma forma, descobrir qual o chamado que Deus tem para mim aqui. Só sei que meu nascimento em si serviu para mostrar à mamãe que mesmo tendo sido uma gravidez indesejada, que mesmo sem papai saber da minha existência, mesmo com a pressão da família e difamação da sociedade sobre nós, um dia ela compreenderia que nada foi em vão. E que, por maiores que tenham se mostrado as dificuldades, jamais poderia compará-la com a maior expressão de amor que há no mundo: dar a vida à outra vida.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Noite, Chuva e Memórias

Essa era pra ter sido a noite mais ansiada dos dois últimos anos. E pela décima sexta vez você sabia que não aconteceria como outrora. A melodia do medo havia tomado conta de você, por completo, elemento por elemento; enquanto era tangível a lembrança de quando o sino da época do colegial começava a ecoar. Não que isso lhe causasse dor ou lhe envolvesse por puro embaraço, apenas não cabia a você entender porque aquela lembrança lhe parecia tão agradável. Ainda assim você soubera disfarçar, a agonia de jamais – em tempo algum – voltar atrás. Você ainda escutava vozes por de trás de ti, misturadas em cheiro, mochilas abertas, caminhadas acompanhadas de brisa e afagos. Você nesse momento podia sentir tudo isso de volta, mas não acompanhado dos mesmos olhares e indivíduos, somente com a melancolia que agora lhe faz melhor companhia. Então quando as primeiras gotas de chuva começaram a cair, enquanto se manifestava em ti a enlouquecida vontade de partir para longe da aflição e apenas permanecer quieto, você se atirou para fora de si. Havia decidido entre a antecipação e o medo caído na sua cama desarrumada, arrastado como uma coberta sob seu próprio corpo. E se indagando repetidas vezes se valia a pena esperar o próximo amanhã, ou a noite do próximo sábado. Limitando-se a pensar que toda sua felicidade poderia se consolidar novamente em apenas uma dessas noites não mais que almejadas, sendo que se assim, todo o resto de sua vida lhe teria sido até hoje completamente em vão.